O brasileiro tem iniciado mais cedo a guerra contra
a balança. Em dez anos, a obesidade avançou em todas as faixas etárias, mas
quase dobrou entre jovens de 18 a 24 anos –de 4,4% para 8,5%.
E embora a prevalência ainda seja maior entre
pessoas com menor escolaridade, a obesidade tem avançado também entre aqueles
com níveis médio e alto de estudo.
A análise vem de levantamento a partir de dados e
microdados de todas as edições do Vigitel, pesquisa do Ministério da Saúde que
investiga hábitos de vida e fatores de risco de doenças crônicas.
Hoje, mais de metade da população adulta está acima
do peso ideal. E cerca de um em cada cinco são obesos, casos em que o IMC
(índice de massa corporal) é igual ou maior que 30 kg/m². O índice cresceu 60%
desde 2006, quando a pesquisa começou a ser feita nas capitais.
Dados obtidos pela Folha mostram que o
avanço da obesidade é ainda maior em algumas categorias. É o caso do índice de
brasileiros com obesidade "moderada" (IMC entre 35 kg/m² e 40 kg/m²).
Se antes essa faixa representava 2,1% da população, agora representa 3,7%
–avanço de 76%.
"Isso mostra que aumenta não só o excesso de
peso, mas a gravidade da doença", diz Michele Lessa, coordenadora de
nutrição e alimentação do Ministério da Saúde.
Já o percentual de adultos com obesidade leve (IMC
entre 30 e 35 kg/m²) cresceu 58% no mesmo período. Na outra ponta, 1,6% dos
adultos têm obesidade "mórbida" ou "grave" (maior que 40
kg/m²).
O índice de sobrepeso e obesidade também cresce na
população infantil. Cerca de 33% das crianças de 5 a 9 anos têm excesso de
peso, e 14,3% são obesos, segundo dados de 2009 do IBGE, os mais recentes
disponíveis.
CRESCIMENTO
Mas o que leva a esse crescimento na balança?
Segundo especialistas, entre os fatores, estão mudança nos hábitos alimentares
(com o arroz e o feijão dando lugar a alimentos mais calóricos), a falta de
atividades físicas e estresse, entre outros.
"Os jovens hoje estão mais em frente às telas.
É uma geração que não se movimenta", diz Cláudia Cozer, coordenadora do
Núcleo de Obesidade e Transtornos Alimentares do Sírio-Libanês.
"Não é culpa só do indivíduo, ainda que,
quando a pessoa faz escolhas mais saudáveis, há bons resultados. Mas há um
conjunto de processos obesogênicos", diz Lessa.
A preocupação é maior diante do risco de doenças
crônicas. "Hoje há jovens de 15 a 25 anos tomando remédios para diabetes,
colesterol e pressão alta. Doenças que apareciam em faixas etárias maiores,
como aos 40, aparecem mais cedo", diz Cozer.
Essa situação já leva a mudanças na rede de saúde.
Em Brasília, o alto número de pacientes com o quadro levou a Secretaria de
Saúde do Distrito Federal a criar, neste mês, um centro especializado para
tratamento de obesidade, hipertensão e diabetes.
Os pacientes são encaminhados pelas unidades de
saúde, com base em uma classificação de risco. O objetivo é receber, por até
dois anos, orientações sobre atividades físicas, reeducação alimentar e acesso
a medicamentos.
"Precisávamos dar vazão à demanda", diz a
endocrinologista Eliziane Leite, que coordena o centro. "São dados
alarmantes. Temos observado cada vez mais jovens com o quadro, além de
idosos."
Impacto semelhante é percebido na rede privada ou
de planos de saúde. Neste ano, a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar)
criou metas para tentar contornar o problema, como estímulo à oferta de
programas de promoção da saúde pelos planos.
Ainda que as atenções se voltem mais à balança, o
baixo diagnóstico e tratamento do sobrepeso e obesidade ainda são impasses, diz
a endocrinologista Maria Edna de Melo, presidente da Abeso (Associação
Brasileira para Estudo da Obesidade). "Não se faz diagnóstico nem se
intervém em casos mais leves. Muitos não consideram a obesidade como
doença."
Para ela, o avanço da obesidade mostra aos
profissionais de saúde que é preciso mudar a abordagem dos pacientes ao
verificar a evolução do peso e pressionar também o governo por políticas mais
efetivas de prevenção.
"Se negligenciamos os casos mais leves,
aumentamos o número de casos mais graves, porque existe essa tendência a se
ficar cada vez mais obeso", diz. Tratar a obesidade, porém, não é simples.